domingo, 17 de maio de 2020

A eugenia dos tempos atuais


Por Getulio Freitas

Na novela Fina Estampa da Rede Globo de Televisão, Christiane Torloni interpreta Teresa Cristina, uma mulher da “alta sociedade”, que ostenta o nome e a riqueza, “o berço de ouro” de onde nasceu, quesitos que segundo ela, a deixam acima das outras pessoas, em outro nível.

Numa das cenas, Teresa sabendo que Grizelda, personagem de Lilia Cabral, pobre, trabalhadora e honesta, nova rica, irá comprar uma mansão no mesmo condomínio que o seu, promove uma reunião de condomínio para impedir que pessoas como Grizelda, sem berço, sem nome e sem requinte se junte ao ambiente privilegiado em que moram.

Parece que a vida imita a arte, ou a arte imita a vida, pois nesta semana algo semelhante ocorreu em Fortaleza, onde uma mãe de um importante colégio particular de Fortaleza demonstra toda sua essência e preocupação ao manifestar o incômodo de ter seu filho tendo aulas online com crianças de outra sede da instituição localizada num bairro que sob seu crivo, não faz jus a sua riqueza e refinamento, conquistados com muito sofrimento.

A preocupação da mãe era que a filha convivesse apenas com pessoas do “seu nível” e “com esforço e trabalho", segundo Jornal o Povo que transcreveu a mensagem, a mulher fala que enriqueceu e que "queria meus filhos convivendo com gente no mínimo do nosso nível.”
É assustador existirem pessoas deste tipo ainda nos tempos atuais! Pessoas que agregam coisas a si para fundamentarem e construírem suas personalidades. É o iPhone, o local onde se mora, o que se come, o local onde se come, onde se compra a roupa, o sobrenome que carrega e dentre outros. Todos estes itens precisam manter a pessoa dentro de um estrito ambiente que a deixe em um nível acessível a poucos.

Não preciso mencionar os comentários quando os pobres começaram trocar rodoviária por aeroporto. Deixaram de cursar até o Ensino Médio e tiveram acesso às Universidades Federais, particulares, onde antes somente uma pequena casta tinha acesso. Estes ambientes passaram a feder no nariz de muitas pessoas de níveis elevadíssimos. E esta realidade que pensávamos superada, está voltando e com muita força e apoio.

Certa vez em um restaurante de Fortaleza muito frequentado por pessoas de “níveis elevados”, uma aluna do mesmo colégio, reclamou com a mãe, que obviamente muito ofendida reportou-se à gerência sobre o constrangimento que sua filha tinha passado: a taxa de serviço da sua amiga foi diferente da dela, o que a deixou muito constrangida diante das demais amigas, apesar da garçonete ter explicado que a taxa de serviço de 10% é fixa, calculada sobre  o consumo individual, o que torna o valor final a pagar variável, e não ser que tivessem consumido o mesmo valor.

Pessoas deste tipo expõem o quanto a humanidade ainda precisa evoluir em matéria de valores, como respeito, solidariedade, senso comum e dentro outros. Pessoas que para elas, empregadas, porteiros, babás e dentre outros, são pessoas inferiores e têm o dever de servi-los incondicionalmente.

A visão da família que vai aos ambientes com a babá toda de fardinha para marcar que ela não é membro da família, mas uma mera serviçal é mais comum do que imaginamos. Empregada se veste diferente, come separada e usa banheiro diferente, para que a genitália da serviçal, mesmo que indiretamente, jamais toque a da outra.

A intenção nefasta que está por trás desse tipo de comportamento é sempre diferenciar, segregar, não misturar, o sangue, a presença, pois a faz descer o nível, a deixa impura e o nome disso é eugenia, o que moveu Hitler ao massacre de milhões de judeus e a implantação do nazismo que privilegiava uma raça pura, inteligente e elevada, a ariana.

Getulio Freitas
Bacharel em Administração de Empresas
Pós-Graduando em Direito Constitucional e Tributário

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